domingo, setembro 16, 2012

CHUVAS TORRENCIAIS



 Osório Martins FAGUNDES*

No final de 1948 e até março de 1949 as chuvas foram ininterruptas, e não somente em Itaúna, como em todo o Estado. E como a rodovia era ainda de terra, ficou praticamente intransitável por toda parte e durante uma semana de março, o trecho de Itaúna a Belo Horizonte ficara mesmo paralisado, porque o "Morro Grande" não dava condições para o trânsito de veículos, quer subindo ou descendo. ...

Decorrida uma semana, depois de uns dois dias de estiagem, embora a estrada continuasse intransitável, com lamaçais e atoleiros por toda parte, resolvi tentar trazer o leite à Cooperativa em Itaúna e me arrependi muito daquele meu arrojo, porque, por incrível que pareça, gastei 5 horas de Azurita a Itaúna.

Nas baixadas, formavam-se ali e acolá, atoleiros de até trinta metros de extensão. A caminhoneta era baixa; quando enfrentava aqueles atoleiros, os pneus deslizavam no barro, e não avançavam nem pra a frente nem para trás, em marcha-ré; cada vez que forçava mais o motor da Studebaker, a situação ia piorando sempre. Trouxera comigo um ajudante e um enxadão, mas isto auxiliava pouco.

E assim que conseguia sair de um atoleiro depois de muito cansaço da máquina e do homem, logo à frente aparecia outro lamaçal. Na descida do morro grande a coisa ficara preta de verdade! 

Embora as jardineiras dos Irmãos Lara tivessem deixado de transitar durante uma semana ou mais, caminhões de outras cidades e mesmo daqui tentavam vencer as dificuldades da estrada, apesar da chuvarada.

No morro grande, as rodas dos caminhões formavam aquelas locas profundas na rodovia, ficando no meio e nas laterais do terreno aqueles facões. Na descida eu procurava equilibrar as rodas da camioneta naquele facão central e outro da lateral, mas, como a estrada estava escorregadia, certa hora as rodas da camioneta deslizaram e caíram dentro daquelas valetas profundas.

E sendo baixa a camioneta, o seu eixo agarrou-se no facão central do terreno e pneus passaram a rodar em falso. Eu ainda tive muita sorte, porque subia naquele momento um carro-de-bois do Sr. Juca Gonçalves, que se destinava lá pra as bandas do Morro das Laranjeiras e eu pedira então ao carreiro que fizesse a caridade de me ajudar a sair dali.

Atendendo ao meu pedido, ele encostou o seu carro-de-bois para um lado, cujo local lhe permitia fazer isso e retirando da sua boiada carreira a junta  de bois-de-guia, amarrara a correia do cambão ao para-choque da camioneta e enquanto a junta de ruminantes, ia puxando a  Studebaker morro abaixo, através do volante, eu ia procurando equilibrá-lo sobre os facões da estrada.

Assim fomos descendo até o final do morro grande, onde a estrada se tornou plana. Dei uma gorjeta ao carreiro e lhe fiquei devendo um grande favor, porque se não fora a sua boa vontade em ajudar-me, certamente eu não teria saído dali naquele dia.

Na frente, nas baixadas da estrada, ainda encontramos outros atoleiros, mas aos poucos íamos vencendo um a um. Assim que atingimos o vargedo do Sr. Artur Contagem Vilaça, a gasolina acabara!  

Eu exclamei então: E mais essa! Mandei o ajudante vir até a cidade e levar um pouco de gasolina num balde, o que demorou uma hora mais ou menos. Cheguei à Cooperativa em  já depois das 13 horas e o leite já devia estar azedando.

O ajudante regressou de trem, à tarde até Azurita, enquanto eu pernoitava na cidade. Como não choveu mais naquele dia da tormentosa viagem, no dia seguinte, o meu retorno à fazenda foi menos trabalhoso. 

Realmente fora uma experiência, bastante amarga o ter vindo à cidade daquele dia, quando a estrada se achava intransitável ainda. Como o tempo foi-se firmando, os carros da Empresa Irmãos Lara e caminhões diversos voltaram a transitar novamente pela estrada, embora com certa dificuldade no começo.                              




Referência:
Texto: FAGUNDES. Osório Martins. Fragmentos De Um Passado, pgs. 419/420, 1977.
Organização: Charles Aquino


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